Como imagina que irá comemorar seu
ultimo aniversário? E se por ventura você já comemorou o ultimo aniversário e
não sabe disso? Já pensou em quantos desejos que não foram desejados nem cumpridos?
Ele sabia que aquele poderia ser o
ultimo aniversário; as últimas velas a apagar; a ultima vez a ouvir o “parabéns
para você nessa data querida...”. Bem verdade que ele sabia que poderia nem
chegar ao seu aniversário algumas semanas à frente.
Internado algumas semanas antes, homem
outrora forte e trabalhador, estava sendo vencido pelo câncer. Fez cirurgia e quimioterapia.
O cabelo ralo escondia a vergonha outrora sentida devido a sua calvície maciça
em decorrência da quimioterapia. Iria iniciar a radioterapia. Em seu corpo, as marcas
da dor, do sofrimento. Ostomias, sondas, feridas e cicatrizes – no corpo, na
alma e no coração.
Chegou fechado, calado e tímido. Senhor
Jose. Sentia uma dor excruciante que não lhe permitia falar, chorar, sentir. A
dor lhe possuía por completo. Ajusta uma dose aqui. Muda uma medicação ali e
logo a dor foi controlada. Deu trabalho, mas foi domada.
Não conseguia andar. O exame de imagem
mostrou um novo diagnostico; estadiamento da doença avançado. Invadiu a pelve,
tomou os ossos. Estava tomando a vida. Não ficava de pé. Não podia sentar; de
lado era doloroso, para o outro lado também; ficava o dia inteiro deitado com a
barriga para cima.
E os dias passaram. A doença não cedia.
A radioterapia tinha pouco efeito. A dor foi controlada.
Nos dias bons, ele contava histórias e
sorria. Nos dias ruins, implorava para ninguém tocar nele. Muitas vezes não
tomou banho para não ter dor. Dor na alma, no corpo, na mente. Dor que
incapacita.
O seu aniversário estava próximo.
Faltavam dois dias. O Senhor Jose compreendia a gravidade da doença. Entendia a
finitude da sua vida. Sua família compreendeu a gravidade, mas tinha
dificuldade em aceitar. Vinham diariamente visita-lo. Alegra-lo. Contar histórias.
Então, uma enfermeira teve uma ideia
brilhante. Entrou em contato com a coordenação daquela ala hospitalar e os
demais serviços responsáveis; estava decidida a fazer uma festa de aniversário
surpresa. Uma festa de aniversário em um hospital!
Aquele foi um dia marcante. Em um
momento estava tudo calmo, em seguida pessoas eufóricas entraram naquele quarto
cantando “parabéns para você...” traziam balões coloridos e um bolo com velas
azuis. A surpresa lhe invadiu em um misto de alegria com satisfação. Com o
celular filmou a sua festa.
Ele chorou de emoção, de alegria e
contentamento. Chorou por ser um dia tão especial, por ter sido lembrado,
acolhido, abraçado e amado.
Estava ali a sua família cheia de amor e
satisfação por mais uma primavera; e a equipe de enfermagem que com amor cuidou
dele. Eles se abraçaram, sorriram e choraram. Juntos comemoram a vida.
Naquele momento, ninguém lembrou da
finitude da vida, ou o estadiamento da doença avançando diariamente. Ninguém lembrou
da dor ou do desconforto. Aquele momento foi de alegria, felicidade, e um amor
puro e verdadeiro. Uma verdadeira festa de aniversário.
Pena que foi a última.
As semanas passaram, com o fim da
radioterapia e por não haver mais nada a ser feito senhor Jose teve alta e
voltou pra casa – feliz e grato por ter vivido enquanto estava vivo.
Poucos dias depois chegou a triste
noticia. A morte era iminente, a dor, o luto, o sofrimento. A paz reinou entre aquela
equipe de enfermagem, pois puderem realizar um desejo de aniversario. O último
aniversário.
*nome e diagnostico ficticios para preservar o sigilo do paciente.